Achei que era culpa do entrevírgulas. Preocupação se aquilo
lá deve entrar ou não ou se, tão volátil a ponto de sair dali sem prejudicar o
sentido, não merecia a aparição. E se já aceitaram “numa”; e se a gente se
esquecer de um hífen, como quando enxerga mal e vai ao cinema, mas não leva os
óculos. Seremos culpados ou seremos cúmplices do mau uso do português? E se
nós, tendo que usar o português para dizer algo simples, mas que pode ser
claramente desenhado pela imagem que habita todo atrás de nossas lentes, não
precisarmos mais da aflição de que o que queremos dizer não ser discutido e,
sim, a discussão pleitear a forma como dissemos. E se os passados imperfeitos
não puderem ser corrigidos? Seremos nós, então, vítimas, culpados ou cúmplices
dessa falta de assunto? E se for medo? E se dissermos algo que até o rei da
escócia se orgulharia e recebermos um único comentário: Escócia e não “escócia”.
A gente explica que sabe muito bem como se escreve, mas que na ansiedade de
compartilhar foi o teclado que não entendeu o comando? E se disserem que você
não sabe nada da história da Escócia?
Eu não culpo essa falta de frases, essa falta de malícia e
um “hahaha” depois de piadas para comprovar que é engraçado. Mas culpo essa
gente raivosa que habita a internet. Que desconta a fome no texto dos outros.
Que desconta a falta de saco de permanecer no trânsito na falta do “c” de
exército que você não escreveu. E que não escreverá mais. E que já que não saiu
na palavra, este “c” caberia muito bem te mandando tomar no c*%#. A gente
aprende a se defender, porém não.
Eu não lembro como a psicologia chama, quando descreve os
papeis em grupo, aquele em que se deposita os anseios bons e ruins do grupo
todo. Talvez seja radar, mas poderia ser pararraio. E não lembro se com o novo acordo
ortográfico pararraio ficou assim ou se é pára-raio ou para-raio, e não quero
consultar o google porque me dou o direito de não lembrar e de errar. Aquele
que na internet se esqueceu que existe. E que, talvez, bem alimentado, você
lembrasse que também costuma acontecer com você. E de que você fica belíssimo
no look do dia, mas podia usar o espaço do texto para um pouco de texto. Que
merece ser usado no espaço que lhe cabe e às vezes onde não lhe cabe também. Que
nos faça refletir porque pensamos com palavras. Porque não conseguimos mais
escrever um e-mail sem titubear. Porque não nos demos conta de que precisamos
sobreviver a esse reflexo do nada. Da síndrome do cérebro oco que não sabe onde
se encher de emoção.
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